Lucas 6 – O Sermão da Planície
A. Jesus e a controvérsia do Sábado.
1. (1-2) A fonte da controvérsia: os discípulos são acusados de “colher” no Sábado.
Certo sábado, enquanto Jesus passava pelas lavouras de cereal, seus discípulos começaram a colher e a debulhar espigas com as mãos, comendo os grãos. Alguns fariseus perguntaram: “Por que vocês estão fazendo o que não é permitido no sábado?”
a. Certo sábado – no segundo sábado: Se o primeiro sábado sem nome foi o mencionado em Lucas 4:31, Lucas deu este marcador de tempo para mostrar o quão ocupado Jesus tinha estado nas duas semanas (segundo sábado) desde o Sábado mencionado em Lucas 4:31.
i. Clarke, junto com outros, acreditam que esta frase se refere ao primeiro sábado após a Páscoa. Há algumas complicações textuais aqui também. Portanto a ideia pode ser simplesmente “no Sábado”.
b. Seus discípulos começaram a colher e a debulhar espigas com as mãos, comendo os grãos: Não havia nada de errado com o que eles faziam. O ato deles de apanhar as espigas não era considerado roubo de acordo com a provisão para os pobres da terra dada em Deuteronômio 23:25.
c. Por que vocês estão fazendo o que não é permitido no sábado?O problema era com o dia em que o faziam. Os rabinos haviam criado uma elaborada lista de itens de coisas que “se podiam fazer” e “que não se podiam fazer” relevantes ao sábado e isto violava um dos itens desta lista.
i. Quando os discípulos fizeram o que fizeram, aos olhos dos líderes religiosos, eles eram culpados de colher, debulhar, joeirar e preparar comida. Havia, portanto, quatro violações do sábado no mesmo bocado.
ii. Esta abordagem do Sábado continua hoje entre os judeus ortodoxos. No início de 1992, inquilinos deixaram três apartamentos em um bairro ortodoxo em Israel queimar completamente enquanto perguntavam a um rabino se um telefonema para os bombeiros no Sábado violaria a lei judaica. Os judeus observantes são proibidos de usar o telefone no sábado, porque isso liberaria uma corrente elétrica, o que é considerado uma forma de trabalho. Na meia hora que levou o rabino para decidir que “sim”, o fogo se espalhou para dois apartamentos vizinhos.
iii. Neste momento, muitos rabinos encheram o judaísmo com elaborados rituais relacionados ao Sábado e a observância de outras leis. Antigos rabinos ensinavam que no sábado era proibido dar um nó – exceto que uma mulher podia dar um nó em sua cinta. Assim, se um balde de água tivesse que ser puxado de um poço, não se podia amarrar uma corda ao balde, mas uma mulher podia amarrar sua cinta ao balde e depois à corda.
2. (3-5) Jesus responde à acusação com dois princípios importantes.
Jesus lhes respondeu: “Vocês nunca leram o que fez Davi, quando ele e seus companheiros estavam com fome? Ele entrou na casa de Deus e, tomando os pães da Presença, comeu o que apenas aos sacerdotes era permitido comer, e os deu também aos seus companheiros”. E então lhes disse: “O Filho do homem é Senhor do sábado”.
a. Vocês nunca leram: Esta foi uma repreensão não tão sutil para os líderes religiosos (os fariseus de Lucas 6:2) que tinham muita confiança no seu conhecimento das Escrituras. Isto fez com que Jesus questionasse se eles alguma vez haviam lido e entendido suas Bíblias; Ele insinuou que eles ignoravam o ponto essencialdo seguinte evento do Antigo Testamento.
i. “É possível ler as Escrituras meticulosamente, conhecer a Bíblia de capa a capa, pode citá-la textualmente e passar qualquer exame sobre ela, e ainda assim não compreender completamente seu verdadeiro significado”. (Barclay)
b. O que fez Davi, quando ele e seus companheiros estavam com fome: A referência ao uso do pão sagrado (pão da Presença) por Davi em 1 Samuel 21:1-6, mostrou o primeiro princípio: a necessidade humana é mais importante do que o ritual religioso.
i. Isto é exatamente o que muitas pessoas, impregnadas de tradição, simplesmente não podem aceitar.
·Eles não acreditam que o que Deus realmente quer é misericórdia antes do sacrifício (Oséias 6:6).
·Eles não acreditam que o amor aos outros é mais importante do que os rituais religiosos (Isaías 58:1-9).
·Eles não acreditam que os sacrifícios que agradam a Deus são um espírito quebrantado; um coração quebrantado e contrito, ó Deus, não desprezarás. (Salmo 51:17).
ii. “Qualquer aplicação da Lei do sábado que opere em detrimento do homem, não está em harmonia com o propósito de Deus”. (Morgan)
iii. O incidente com Davi foi uma defesa válida, porque:
·Foi um caso de comer.
·Provavelmente aconteceu no sábado (1 Samuel 21:6).
·Não se tratava apenas de Davi, mas também de seus seguidores.
c. O Filho do homem é Senhor do sábado: O segundo princípio foi ainda mais dramático. Jesus disse que Ele é o Senhor do Sábado, e o Senhor do Sábado não se ofendeu com as ações de Seus discípulos; então nem estes líderes religiosos deveriam ter se ofendido.
i. Esta foi uma reivindicação direta à Divindade. Jesus disse que tinha autoridade para saber se Seus discípulos violaram a lei do Sábado, porque Ele é o Senhor do Sábado.
3. (6-8) Jesus entra na sinagoga e vê o homem com a mão atrofiada.
Noutro sábado, ele entrou na sinagoga e começou a ensinar; estava ali um homem cuja mão direita era atrofiada. Os fariseus e os mestres da lei estavam procurando um motivo para acusar Jesus; por isso o observavam atentamente, para ver se ele iria curá-lo no sábado. Mas Jesus sabia o que eles estavam pensando e disse ao homem da mão atrofiada: “Levante-se e venha para o meio”. Ele se levantou e foi.
a. Ele entrou na sinagoga: Lucas mostrou a resistência crescente contra Jesus e seus seguidores. No entanto, Jesus ainda frequentava os cultos da sinagoga e não abandonou a ajuntamento do povo de Deus – mesmo quando poderíamos pensar que Ele tinha motivos para isso.
b. Os fariseus e os mestres da lei… o observavam atentamente, para ver se ele iria curá-lo no sábado: Por suas próprias ações, os fariseus admitiram que Jesus tinha o poder de Deus para fazer milagres, mas procuraram prendê-Lo. Era como se um homem pudesse voar e as autoridades o prendessem por não aterrissar em aeroportos.
i. Os líderes religiosos observavamJesus atentamente, mas sem nenhum afeto de coração por Ele. Podemos observar Jesus, mas ainda assim estar com nossos corações longe Dele.
ii. “Pode até ser que eles tenham propositalmente armado para Jesus trazendo o homem para a sinagoga”. (Pate) Talvez eles tivessem uma expectativa maior de que Jesus faria tal milagre do que os próprios seguidores de Jesus.
4. (9-11) O Senhor do Sábado cura no Sábado.
Jesus lhes disse: “Eu lhes pergunto: O que é permitido fazer no sábado: o bem ou o mal, salvar a vida ou destruí-la?” Então, olhou para todos os que estavam à sua volta e disse ao homem: “Estenda a mão”. Ele a estendeu, e ela foi restaurada. Mas eles ficaram furiosos e começaram a discutir entre si o que poderiam fazer contra Jesus.
a. O que é permitido fazer no sábado: o bem ou o mal, salvar a vida ou destruí-la? Em sua pergunta aos líderes religiosos, Jesus enfatizou a verdade sobre o Sábado. Nunca há um dia errado para se fazer algo verdadeiramente bom.
i. Na abordagem legalista adotada pelos líderes religiosos dos dias de Jesus (que foi além das ordens da própria Bíblia), eles claramente negligenciaram atos de compaixão e amor para com os necessitados. “Certamente, não há profanação de ordenanças divinas tão poderosas como aquela que obstrui a corrente da compaixão”. (Morgan)
ii. O cristão moderno tem o desafio de demonstrar amor e compaixão para com todos, e de defender fielmente o padrão moral claramente afirmado por Deus em assuntos de controvérsia social.
b. Estenda a mão: Quando Jesus ordenou ao homem “estenda a mão”, Ele ordenou ao homem que fizesse algo impossível na condição em que estava. Mas Jesus deu tanto a ordem quanto a capacidade de cumpri-la, e o homem fez o esforço e foi curado.
c. Mas eles ficaram furiosos: A reação dos líderes religiosos foi chocante, mas verdadeira. Quando Jesus fez este milagre no sábado, Ele atendeu as necessidades das pessoas simples e quebrou as tradições religiosas insignificantes do estabelecimento. Obviamente, a fúria e conspiração de assassinato deles contra Jesus (começaram a discutir entre si o que poderiam fazer contra Jesus) foram violações do sábado muito mais graves do que a cura da mão atrofiada do homem.
i. Jesus muitas vezes repreendeu os líderes religiosos de sua época por este tipo de atitude. Ele disse deles, vocês negligenciam os mandamentos de Deus e se apegam às tradições dos homens… uma boa maneira de pôr de lado os mandamentos de Deus, a fim de obedecerem às suas tradições… anulam a palavra de Deus, por meio da tradição. (Marcos 7:8-9, 7:13)
iii. Jesus não estava tentando reformar o Sábado. Ele tentou mostrar que, no entendimento deles sobre o Sábado, eles haviam perdido o principal objetivo. Um legalista quer debater as regras; mas a questão não era quais regras eram as regras corretas; a questão era a maneira simples de se aproximar de Deus. Enfatizamos que não se baseia no que fazemos por Ele, mas no que Ele fez por nós em Jesus Cristo.
B. A escolha dos doze apóstolos.
1. (12-13) Jesus escolhe os doze.
Num daqueles dias, Jesus saiu para o monte a fim de orar, e passou a noite orando a Deus. Ao amanhecer, chamou seus discípulos e escolheu doze deles, a quem também designou apóstolos:
a. Num daqueles dias, Jesus saiu para o monte a fim de orar: Jesus estava em um ponto crítico de seu ministério:
·Ele ofendeu as tradições da liderança religiosa, e eles começaram a planejar sua morte.
·A liderança política também começou a tramar Sua destruição (de acordo com Marcos 3:6).
·Grandes multidões O seguiram, mas não estavam interessadas em coisas espirituais, e podiam se voltar rapidamente contra Jesus.
i. Em resposta a estas pressões e situações de mudança, Jesus se isolou para este tempo de oração especial. Imaginamos que Jesus orava constantemente, mas para esta necessidade particular Jesus saiu para o monte a fim de orar. “Jesus, portanto, para evitar a interrupção, para se dar a oportunidade de derramar toda sua alma, e para evitar a ostentação, procurou o monte”. (Spurgeon)
ii. Então, estando sozinho no monte, Jesus passou a noite orando, antes de escolher doze entre os discípulos que se tornariam seus apóstolos.
b. E passou a noite orando a Deus: Jesus estava prestes a escolher seus discípulos. Em certo sentido, não havia nada nos três anos de ministério de Jesus antes da cruz mais importante do que isto. Estes eram os homens que continuariam o que Ele havia feito e, sem eles, a obra de Jesus nunca se estenderia ao mundo inteiro. Não é à toa que Jesus deu a esta escolha crítica uma noite inteira de oração.
i. Jesus era Deus; no entanto, Ele não usou simplesmente seu infinito conhecimento para escolher os apóstolos. Ao invés disso, Ele orou a noite inteira. Como qualquer outra luta que Jesus enfrentou, Ele enfrentou esta como um homem; um homem que precisava buscar a vontade de seu Pai e confiar no poder do Espírito Santo, assim como nós o fazemos.
ii. A noite: “Uma noite sozinho em oração pode fazer de nós novos homens, transformados da pobreza de alma em riqueza espiritual, de tremores em triunfo”. (Spurgeon)
c. Chamou seus discípulos: Os discípulos (e também os apóstolos, aliás) pertenciam a Jesus. Os discípulos nunca pertencem a nenhum homem; eles pertencem somente a Jesus. Eles são seus discípulos.
i. “Um discípulo era um aprendiz, um estudante, mas no primeiro século um estudante não estudava simplesmente um assunto; ele seguia um professor. Há um elemento de apego pessoal no ‘discípulo’ que falta no ‘estudante’”. (Morris)
d. E escolheu doze deles: Jesus escolheu doze apóstolos porque este era o fundamento do novo povo escolhido, e como Israel tinha doze tribos, Jesus também teria doze apóstolos.
e. A quem também designou apóstolos: Dentre o grupo de Seus seguidores (o grupo maior de discípulos), Ele escolheu doze para serem apóstolos.
i. A ideia por trás da antiga palavra grega para apóstolo é “embaixador”. “A palavra grega é apostolos, que significa ‘aquele que é enviado’”. (Pate) Ela descreve alguém que representa uma outra pessoa e leva uma mensagem de quem o enviou. Neste sentido mais amplo, Jesus também foi um apóstolo de acordo com Hebreus 3:1: fixem os seus pensamentos em Jesus, apóstolo e sumo sacerdote que confessamos.
2. (14-16) Os doze listados.
Simão, a quem deu o nome de Pedro; seu irmão André; Tiago; João; Filipe; Bartolomeu; Mateus; Tomé; Tiago, filho de Alfeu; Simão, chamado zelote; Judas, filho de Tiago; e Judas Iscariotes, que veio a ser o traidor.
a. Pedro… André… Tiago e João: Realmente não sabemos muito sobre a maioria desses homens. De Pedro, Tiago, João e Judas sabemos um pouco. No entanto, dos outros oito, praticamente só sabemos o nome deles. A fama deles está reservada para o céu, onde seus nomes estão sobre os doze fundamentos da cidade celestial de Deus (Apocalipse 21:14).
b. Há muitas conexões interessantes com este grupo. Há irmãos (Tiago e João, Pedro e André); parceiros de negócios (Pedro, Tiago e João eram todos pescadores); pontos de vista políticos opostos (Mateus, o cobrador de impostos amigo dos romanos, e Simão, o zelote que odeia os romanos); e um que trairia Jesus (Judas Iscariotes, que veio a ser o traidor).
i. “O sobrenome de Judas Iscariotes indica provavelmente que ele era um homem da cidade de Queriote; assim, ele parece ter sido o único judeu entre os doze”. (Geldenhuys)
ii. Parece que os nomes dos doze discípulos são geralmente dispostos em pares. “Como Jesus enviou Seus Apóstolos dois a dois, esta foi uma forma lógica de listá-los”. (Wiersbe)
·Pedro e André.
·Tiago e João.
·Filipe e Bartolomeu (também chamado Natanael em João 1:45).
·Mateus (Levi) e Tomé (seu nome significa “gêmeo”).
·Tiago, filho de Alfeu e Simão, o zelota.
·Judas, o filho de Tiago (também chamado Tadeu em Marcos 3:18) e Judas Iscariotes.
c. Judas Iscariotes, que veio a ser o traidor: Jesus escolheu Judas, sabendo como ele se tornaria um traidor. Jesus mais tarde disse a Seus discípulos que os escolheu, e sabia que um deles era um diabo (João 6:70).
i. Jesus também tinha muitos outros para escolher. Ele escolheu estes doze entre muitos outros.
ii. Jesus não estava à procura de uma pessoa nervosa para fazer escândalo ou controvérsia. Não lemos sobre nenhum outro escândalo acerca de Judas durante o ministério de Jesus. Os outros discípulos pareciam fazer coisas até piores durante os três anos que passaram com Jesus.
iii. Jesus escolheu Judas conhecendo-o e o que ele faria, mas também sabendo que Deus permitiria e até usaria o grande mal que Judas fez para o grande bem, apesar da intenção de Judas.
iv. Um homem uma vez perguntou a um teólogo: “Por que Jesus escolheu Judas Iscariotes para ser seu discípulo?”. O professor respondeu: “Não sei, mas tenho uma pergunta ainda mais difícil: Por que Jesus me escolheu?”.
3. (17-19) Jesus ministra a cura e a libertação de uma multidão.
Jesus desceu com eles e parou num lugar plano. Estavam ali muitos dos seus discípulos e uma imensa multidão procedente de toda a Judéia, de Jerusalém e do litoral de Tiro e de Sidom, que vieram para ouvi-lo e serem curados de suas doenças. Os que eram perturbados por espíritos imundos ficaram curados, e todos procuravam tocar nele, porque dele saía poder que curava todos.
a. Jesus desceu com eles: Jesus desceu com eles (Seus discípulos) para servir e abençoar esta multidão. Jesus não só os ensinou a servir aos outros; Ele queria que eles O ajudassem. Aqui eles pareciam trabalhar como uma equipe.
i. Jesus poderia ter feito tudo isso sozinho. Mas era importante que Ele trabalhasse em equipe com estes doze, tanto para o bem deles como para o bem da obra.
b. E parou num lugar plano: A obra descrita nestes poucos versículos e o ensino registrado até o final do capítulo foi realizado num lugar plano. Para alguns, esta é uma distinção útil que marca o seguinte ensinamento do ensinamento em um monte descrita em Mateus 5-7.
i. Entretanto, alguns observaram que a área ao redor do Mar da Galiléia – incluindo o tradicional Monte das Bem-aventuranças, onde o Sermão da Montanha é dito ter sido entregue – é como uma montanha, olhando a partir do Mar da Galileia, mas como um lugar plano quando se está de pé em cima dela.
c. Estavam ali muitos dos seus discípulos e uma imensa multidão procedente de toda a Judéia, de Jerusalém e do litoral de Tiro e de Sidom: As pessoas vinham de longe para serem curadas e libertadas de espíritos demoníacos por Jesus, mesmo de cidades gentílicas como Tiro e Sidom.
d. E todos procuravam tocar nele: Esta foi uma cena dramática; centenas ou milhares de pessoas se aglomerando para tocar nele, esperando receber algo milagroso dEle. Naquela cena e contexto, Jesus os ensinou. Poderíamos dizer que Ele interrompeu o serviço de cura e deu um estudo bíblico.
e. Dele saía poder que curava todos: Jesus não só tinha o poder de Deus Nele; também era verdade que o poder saía dele enquanto Ele curava todos.
i. Quando a mulher do fluxo de sangue tocou a bainha da veste de Jesus e foi curada, é escrito sobre Jesus: No mesmo instante, Jesus percebeu que dele havia saído poder (Marcos 5:30). Como Jesus serviu às necessidades dos outros, tanto em Seu ministério de pregação/ensino como em atos milagrosos, algo havia saído dele. Certamente lhe custou algo ser usado por Deus e servir aos outros.
4. (20a) Jesus se prepara para ensinar a seus discípulos e à multidão.
Olhando para os seus discípulos, ele disse:
a. Olhando para os seus discípulos: Jesus aqui começou uma seção de ensino frequentemente chamada Sermão da Planície, porque foi feito num lugar plano (Lucas 6:17), e para ter uma distinção do Sermão da Montanha registrado em Mateus 5-7.
i. A mensagem registrada em Mateus 5-7 é semelhante em muitos aspectos à passagem em Lucas, mas também há diferenças. O relato de Lucas, principalmente, é muito mais curto. Muitos se perguntam se estas são duas ocasiões distintas de ensinamentos, ou se são a mesma ocasião.
ii. A opinião dos estudiosos é dividida sobre esta questão. Mas devemos lembrar que Jesus era um pregador itinerante, e sua ênfase principal era o Reino de Deus (ver Lucas 4:43).
iii. Os pregadores itinerantes muitas vezes se repetem para multidões diferentes, especialmente quando ensinam sobre o mesmo tema. Este é provavelmente o mesmo sermão de Mateus 5-7, mas possivelmente em um momento e lugar diferente.
b. Para os seus discípulos: No evangelho de Lucas, não é por acaso que esta grande mensagem de Jesus vem logo após a escolha dos doze (Lucas 6:12-16) e antes Dele enviar os discípulos para pregar em todas as cidades da Galiléia (Lucas 9:1-6). Fez parte do ensinamento deles ouvir e compreender esta mensagem, porque ajudou a explicar claramente o que significava ser um seguidor de Jesus, o Messias.
i. “Pode-se supor que o sermão serviu a uma dupla função: encorajar a fidelidade entre os discípulos de Jesus e desafiar os não-discípulos a segui-lo”. (Pate)
ii. É evidente que o Sermão da Planície (e o Sermão da Montanha) tiveram um impacto significativo sobre a Igreja Primitiva. Os cristãos primitivos frequentemente faziam referência a eles e suas vidas brilhavam com a glória de discípulos radicais.
c. Ele disse: O que Jesus disse no Sermão da Planície (e no Sermão da Montanha) há muito tempo foi reconhecido como a soma dos ensinamentos éticos de Jesus – ou de qualquer pessoa. No Sermão da Planície, Jesus disse a seus seguidores e futuros seguidores como viver.
i. Foi dito que se você seguisse todos os bons conselhos já proferidos por qualquer filósofo, psiquiatra ou conselheiro sobre como viver, se retirasse as loucuras e se resumisse tudo ao verdadeiro essencial, lhe restaria somente uma pobre imitação desta grande mensagem de Jesus.
ii. O Sermão da Montanha é às vezes pensado como a “Declaração do Reino” de Jesus. Os revolucionários americanos tiveram sua Declaração de Independência. Karl Marx tinha seu Manifesto Comunista. Com esta mensagem, Jesus explicou a agenda e o plano de seu Reino.
iii. Ela apresenta uma agenda radicalmente diferente do que a nação de Israel esperava do Messias. Ela não apresenta as bênçãos políticas ou materiais do reinado do Messias. Em vez disso, expressa as implicações espirituais do governo de Jesus em nossas vidas. Esta grande mensagem nos diz como viveremos quando Jesus for nosso Senhor.
iv. É importante compreender que o Sermão da Montanha não lida com a salvação em si, mas estabelece para o discípulo e para o possível discípulo, como o considerar Jesus como Rei se traduz em ética e vida diária.
v. “Este pode ser um exemplo do método judaico de pregação. Os judeus chamam a pregação de Charaz, que significa colar de missangas. Os rabinos afirmavam que o pregador nunca devia se alongar muito em cima do mesmo tópico e sim passar rapidamente de um assunto para outro para manter o interesse do ouvinte”. (Barclay)
C. O surpreendente plano do Reino de Deus.
1. (20b) Bênçãos para os pobres.
“Bem-aventurados vocês, os pobres, pois a vocês pertence o Reino de Deus.
a. Bem-aventurados: Jesus prometeu bênçãos a seus discípulos, prometendo que os pobres seriam bem-aventurados. A ideia por trás da antiga palavra grega para bem-aventurado é “feliz”, mas no sentido mais verdadeiro e piedoso da palavra, não no nosso sentido moderno de apenas estarmos confortáveis ou entretidos no momento.
i. Esta mesma palavra para bem-aventurado – que em certo sentido significa “feliz” – é atribuída a Deus em 1 Timóteo 1:11: se vê no glorioso evangelho que me foi confiado, o evangelho do Deus bendito. “Makarios descreve então aquela alegria que tem seu segredo dentro de si; aquela alegria que é serena e intocável, e autocontida; aquela alegria que é completamente independente de todas as chances e mudanças da vida”. (Barclay)
ii. Em Mateus 25:34, Jesus disse que no Dia do Juízo Ele diria ao Seu povo: Venham, benditos de meu Pai! Recebam como herança o Reino que lhes foi preparado desde a criação do mundo. Nesse dia, Ele julgará entre o bendito e o amaldiçoado – Ele tanto sabe quanto explica quais são os requisitos para o bendito. Também podemos dizer que ninguém foi mais bendito do que Jesus; Ele sabe o que há em uma vida bendita.
iii. “Note também, com deleite, que a bênção é em todos os casos no tempo presente, uma felicidade para agora se desfrutar e encontrar deleito”. Não é ‘Bem-aventurado será’, mas sim ‘Bem-aventurados são”. (Spurgeon)
b. Bem-aventurados vocês, os pobres: No antigo vocabulário grego há várias palavras que podem ser usadas para descrever a pobreza. Jesus usou a palavra que indica uma pobreza severa; a ideia é de alguém que deve implorar por tudo o que tem ou terá.
i. Imediatamente, esta afirmação nos surpreende com sua estranheza. Bem-aventurado por ser pobre? Isso não faz sentido algum. No entanto, o poder e a sabedoria nesta verdade residem no fato de que o pobre homem deve buscar nos outros o que ele precisa. Ele não tem ilusões sobre sua capacidade de prover para si mesmo.
ii. Embora haja muita sabedoria prática nos ensinamentos de Jesus, Ele foi um homem espiritual e ensinou sobre temas espirituais. A pobreza que Jesus mais tinha em mente era a pobreza de espírito, e foi exatamente assim que Ele fraseou no sermão registrado em Mateus 5.
iii. Os pobres de espírito reconhecem que não têm bens espirituais. Eles sabem que estão espiritualmente falidos. A pobreza de espírito não pode ser induzida artificialmente pelo ódio a si mesmo. Ela vem quando o Espírito Santo trabalha em nosso coração e nós respondemos a Ele.
iv. Todos podem começar aqui; não é primeiro bem-aventurado o puro, ou o santo, ou o espiritual, ou o maravilhoso. Todos podem ser pobres em espírito. “Não o que tenho, mas o que não tenho, é o primeiro ponto de contato, entre minha alma e Deus”. (Spurgeon)
c. Pois a vocês pertence o Reino de Deus: Mas aqueles que são pobres de espírito, tão pobres que devem implorar, são recompensados: eles recebem o Reino de Deus. Portanto, a pobreza de espírito é um pré-requisito absoluto para receber o reino, porque enquanto mantivermos ilusões sobre nossos próprios recursos espirituais, jamais receberemos de Deus o que absolutamente precisamos.
i. Esta bênção para os pobres é colocada em primeiro lugar por uma razão, porque coloca em perspectiva os seguintes comandos. Eles não podem ser cumpridos em nossas próprias forças, mas somente pela confiança de um mendigo no poder de Deus.
2. (21a) Bênçãos para os famintos.
Bem-aventurados vocês, que agora têm fome, pois serão satisfeitos.
a. Bem-aventurados vocês, que agora têm fome: A pessoa faminta procura; ela procura comida e espera satisfazer seu apetite. Sua fome a impulsiona e lhe dá um único foco. Jesus descreveu a bem-aventurança daqueles que se concentram nele e na Sua justiça como um homem faminto se concentra no alimento.
·Esta paixão é real, assim como a fome é real.
·Esta paixão é natural, assim como a fome é natural em uma pessoa saudável.
·Esta paixão é intensa, assim como a fome é intensa.
·Esta paixão pode ser dolorosa, assim como a fome real pode causar dor.
·Esta paixão é uma força impulsionadora, assim como a fome pode impulsionar um homem.
·Esta paixão é um sinal de saúde, assim como a fome mostra saúde.
i. É bom lembrar que Jesus disse isto em um dia e a uma cultura que realmente sabia o que era ter fome e sede. O homem moderno – pelo menos no mundo ocidental – está muitas vezes distante das necessidades básicas da fome e da sede. Para nós é difícil sentir fome e sede por Jesus e a sua retidão.
ii. Mateus presenciou Jesus dando uma mensagem semelhante, e o registrou com estas palavras: Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça (Mateus 5:6). Como Jesus falou mais do que a fome física; até mesmo Seu sermão em Lucas implica este tipo de desejo. A fome de justiça pode se expressar de várias maneiras:
·Um homem anseia por ter uma natureza justa.
·Um homem quer ser santificado, para se tornar mais santo.
·Um homem anseia por continuar na justiça de Deus.
·Um homem anseia por ver a justiça promovida no mundo.
b. Pois serão satisfeitos: Jesus prometeu saciar o faminto; saciá-locom o máximo que pudesse comer. É uma maneira estranha de se saciar, que tanto nos satisfaz quanto nos mantém ansiosos por mais.
3. (21b) Bênçãos para aqueles que choram.
Bem-aventurados vocês, que agora choram, pois haverão de rir.
a. Bem-aventurados vocês, que agora choram: O choro é pela condição precária e carente tanto do indivíduo quanto da sociedade; mas com a consciência de que estão carentes e em condição precária por causa do pecado. Vocês que agora choram realmente choram por causa do pecado e seus efeitos.
i. Este luto é a tristeza piedosa que produz o arrependimento para a salvação que Paulo descreveu em 2 Coríntios 7:10. Aqueles que choram podem conhecer algo especial de Deus; a participação em Seus sofrimentos (Filipenses 3:10), uma proximidade com o Homem de Dores que conhecia o sofrimento (Isaías 53:3).
ii. “Não acredito naquela fé que não tem uma lágrima nos olhos quando olha para Jesus. A fé de olhos secos me parece ser fé bastarda, não nascida do Espírito de Deus”. (Spurgeon)
b. Pois haverão de rir: Aquele que realmente se entristece com sua condição espiritual pode rir genuinamente quando Deus coloca as coisas no lugar. O choro pode persistir uma noite, mas de manhã irrompe a alegria. (Salmo 30:5).
c. Agora: Em cada uma destas três declarações paradoxais – descrevendo a condição espiritual de uma pessoa em termos de pobreza, fome e choro – Jesus usou a palavra de esperança agora.
·Agora você é pobre; um dia receberá o reino.
·Agora tendes fome; um dia sereis saciado.
·Chorais agora; um dia rirás.
i. Alguns são levados pela ideia de que Jesus foi mais um organizador comunitário ou revolucionário do que um verdadeiro pregador e mestre, e que Jesus quis com estas declarações de bênção subverter a ordem social e dar poder aos oprimidos.
ii. Jesus estava de fato extremamente preocupado em dar poder aos oprimidos, mas colocou seu foco contra a maior opressão de todas – a tirania do pecado e a separação que há entre Deus e o homem. Enquanto não ignorava a necessidade dos que eram pobres, famintos e que choravam no sentido físico, Jesus concentrou-se na revolução espiritual que os mudaria e, eventualmente, mudaria a sociedade também.
iii. Na verdade, o que Jesus disse aqui é contra o espírito do revolucionário social porque Ele dá às pessoas esperança em sua pobreza atual, fome e choro. O revolucionário quer tirar toda a esperança atual e exigir que as pessoas tomem medidas imediatas (frequentemente violentas, às vezes assassinas) para supostamente mudar as coisas. O fruto amargo deste pensamento pode ser contado nas centenas de milhões de mortos pelos assassinos da ideologia comunista. Jesus mostra um caminho melhor, um caminho de verdadeira esperança.
4. (22-23) Bênçãos para os odiados.
Bem-aventurados serão vocês, quando os odiarem,
Expulsarem e insultarem,
E eliminarem o nome de vocês, como sendo mau,
Por causa do Filho do homem.
“Regozijem-se nesse dia e saltem de alegria,
Porque grande é a sua recompensa no céu.
Pois assim os antepassados deles trataram os profetas.
a. Bem-aventurados serão vocês, quando os odiarem: Pensamos no povo que vê a si mesmo como espiritualmente pobre e faminto; que com choro busca a Deus. Parece impossível que essas pessoas sejam odiadas, mas elas o são.
b. Expulsarem e insultarem… eliminarem o nome de vocês, como sendo mau: Isto fala da extensão do ódio que seria trazido contra os seguidores de Jesus e, pior ainda, que cairia sobre eles. Jesus disse que, por isso, Seus seguidores (por causa do Filho do homem) seriam bem-aventurados.
i. Não demorou muito para que estas palavras de Jesus se tornassem verdadeiras sobre Seus seguidores. Os primeiros cristãos ouviram muitos inimigos expulsá-los, insultá-los e considerar seus nomes como sendo mau. Os cristãos eram acusados de:
·Canibalismo, por causa da deturpação grosseira e deliberada da prática da Ceia do Senhor.
·Imoralidade, por causa da deturpação grosseira e deliberada da “Festa do Amor” semanal e de suas reuniões particulares.
·Fanatismo revolucionário, porque acreditavam que Jesus voltaria e que haveria um fim apocalíptico para a história.
·Dividir famílias, porque quando um dos cônjuges ou pais se tornava cristão, ocorria muitas vezes mudanças e divisões na família.
·Traição, porque eles não honravam os deuses romanos e não participavam do culto ao imperador.
c. Regozijem-se nesse dia e saltem de alegria: É um paradoxo ser tão feliz quando tão odiado; mas o perseguido pode porque grande é a sua recompensa no céu, e porque os perseguidos estão em boa companhia: os profetas que os precederam também foram perseguidos.
i. Trapp nomeia alguns homens que de fato se regozijaram e saltaram de alegria quando foram perseguidos. George Roper veio à estaca na qual foi queimado saltando de alegria e a abraçou como se fosse um amigo. O Doutor Taylor saltou e dançou um pouco quando chegou à sua execução, dizendo quando lhe perguntaram como estava: “Bem, Deus seja louvado, bom Mestre Xerife, nunca estive melhor; pois agora estou quase em casa… na casa de meu Pai”. Lawrence Saunders, que com um rosto sorridente abraçou a estaca de sua execução e a beijou dizendo: “Bem-vindo à cruz de Cristo; bem-vindo vida eterna”.
5. (24-26) Estranhos ais.
“Mas ai de vocês, os ricos,
Pois já receberam sua consolação.
Ai de vocês, que agora têm fartura,
Porque passarão fome.
Ai de vocês, que agora riem,
Pois haverão de se lamentar e chorar.
Ai de vocês, quando todos falarem bem de vocês,
Pois assim os antepassados deles trataram os falsos profetas.
a. Ai: Esta era uma expressão de arrependimento e compaixão, não uma ameaça. Os ais que Jesus pronunciou parecem tão paradoxais quanto Suas bênçãos. Normalmente, não vemos nenhum ai em ser rico ou ter fartura ou em rir, ou quando falam bem de nós.
b. Mas ai de vocês, os ricos…Ai de vocês, que agora têm fartura: Riqueza, nenhum senso de necessidade, excitação contínua e bons momentos são um verdadeiro obstáculo para chegar no reino. Normalmente não chegaremos a Jesus da maneira que deveríamos até sabermos que somos pobres, famintos e necessitados de conforto.
i. Em cada um desses ditos paradoxais, Jesus contrastou as expectativas atuais do reino com a realidade espiritual de Seu Reino. Jesus nos disse que Deus faz coisas inesperadas. Jesus escarneceu dos valores do mundo. Ele exaltou o que o mundo despreza e rejeitou o que o mundo admira. Jesus virou de cabeça para baixo (ou melhor, de cabeça para cima) a percepção que o povo tinha do Reino de Deus.
D. A agenda de Deus é um plano de amor.
1. (27-28) Ame seus inimigos.
“Mas eu digo a vocês que estão me ouvindo: Amem os seus inimigos, façam o bem aos que os odeiam, abençoem os que os amaldiçoam, orem por aqueles que os maltratam.
a. Amem os seus inimigos: Este é um comando extremamente simples de entender, mas difícil de obedecer. Jesus nos disse exatamente como amar de fato nossos inimigos: façam o bem, abençoem, e orem por aqueles que os maltratam.
i. Jesus reconheceu que nós teríamos inimigos. Este plano do Reino de Deus leva em conta os problemas do mundo real. Embora tenhamos inimigos, ainda assim devemos responder a eles com amor, confiando que Deus protegerá nossa causa e destruirá nossos inimigos da melhor maneira possível, transformando-os em nossos amigos.
b. Façam o bem, abençoem… orem por aqueles que os maltratam: O amor que Jesus nos disse para termos por nossos inimigos não era de um sentimento caloroso, difuso no fundo do coração; se esperarmos por isso, talvez nunca os amemos. O amor por nossos inimigos é um amor que faz algo por eles, independentemente do que possamos sentir por eles.
i. Abençoem os que os amaldiçoam significa que devemos falar bem daqueles que falam mal de nós.
ii. “Não podemos amar nossos inimigos como amamos nossos mais próximos e queridos. Fazer isso seria antinatural, impossível e até errado. Mas podemos fazer com que, não importa o que um homem nos faça, mesmo que ele insulte, maltrate e nos machuque, não buscaremos nada além de seu bem mais elevado”. (Barclay)
2. (29-30) Esteja disposto a sofrer injustiças.
Se alguém lhe bater numa face, ofereça-lhe também a outra. Se alguém lhe tirar a capa, não o impeça de tirar-lhe a túnica. Dê a todo aquele que lhe pedir, e se alguém tirar o que pertence a você, não lhe exija que o devolva.
a. Se alguém lhe bater numa face, ofereça-lhe também a outra: Continuando seu extraordinário ensinamento, Jesus disse que devemos aceitar certos males cometidos contra nós.
i. Quando uma pessoa nos insulta (lhe bater numa face), queremos devolver-lhe o que ela nos deu, e até mais. Jesus disse que devemos suportar pacientemente tais insultos e ofensas, e não resistir a uma pessoa má que nos insulte desta maneira. Ao invés disso, confiamos em Deus para nos defender. A França aponta que os antigos escritos judeus dizem que golpear alguém com as costas da mão – um grave insulto – era punível com uma multa muito pesada, segundo Mishnah BK 8:6.
ii. É errado pensar que Jesus quis dizer que o mal nunca deve ser combatido. Jesus demonstrou com sua própria vida que o mal deve absolutamente ser resistido, como quando Ele virou as mesas no templo.
iii. “Jesus está aqui dizendo que o verdadeiro cristão aprendeu a não se ressentir de nenhum insulto e a não buscar a retaliação por nenhuma ofensa”. (Barclay) Quando pensamos como o próprio Jesus foi insultado e ofendido (como um glutão, um bêbado, um filho ilegítimo, um blasfemador, um louco, e assim por diante) vemos como Ele mesmo viveu este princípio.
iv. É errado pensar que Jesus quis dizer que não se possa resistir ou se defender de um ataque físico. Quando Jesus falou da bofetada numa face, foi entendido culturalmente como um insulto profundo, não como um ataque físico. Jesus não quis dizer que se alguém bater no lado direito da nossa cabeça com um taco de beisebol, devemos permitir que ele bata também no lado esquerdo. 2 Coríntios 11:20 provavelmente se refere a este tipo de bofetada insultuosa.
v. Também é errado pensar que Jesus quis dizer que não há lugar para punição ou retribuição na sociedade. Aqui, Jesus falou se referiu às relações pessoais, e não às funções próprias do governo na contenção do mal (Romanos 13:1-4). Devo dar a face quando sou insultado pessoalmente, mas o governo tem a responsabilidade de reprimir o homem mau de uma agressão física.
b. Se alguém lhe tirar a capa, não o impeça de tirar-lhe a túnica. Dê a todo aquele que lhe pedir: Com isto, Jesus nos disse como lidar com as pessoas que nos maltratam, coagem e manipulam. Devemos tomar o controle da situação através de sacrifícios de doação e amor.
i. Segundo a Lei de Moisés, o manto era algo que não podia ser retirado de alguém (Êxodo 22:26; Deuteronômio 24:13).
ii. “Os discípulos de Jesus, se lhes pedem suas túnicas (um traje interior como o nosso terno, mas usado junto à pele), sem querer buscar satisfação, de bom grado se separariam do que podiam manter legalmente”. (Carson)
iii. “O velho dizia: Insista por seu próprio direito e ame seu próximo, odeie seu inimigo, e assim garanta sua segurança. O novo diz: Sofra o mal, e prodigalize seu amor por todos”. (Morgan)
c. E se alguém tirar o que pertence a você, não lhe exija que o devolva: Só podemos praticar este tipo de amor sacrificial quando sabemos que Deus cuidará de nós. Sabemos que se doarmos nossa túnica, Deus tem muito mais para nos dar.
i. O único limite para este tipo de sacrifício é o limite que o próprio amor vai impor. Não é amar ceder à manipulação de alguém sem que o transformemos em um ato de amor livre. Nem sempre é amar dar ou não resistir.
ii. Poderíamos dizer que Paulo repetiu esta ideia de Jesus: Não se deixem vencer pelo mal, mas vençam o mal com o bem. (Romanos 12:21)
3. (31) A Regra de Ouro.
Como vocês querem que os outros lhes façam, façam também vocês a eles.
a. Como vocês querem que os outros lhes façam, façam também vocês a eles: A forma negativa de declarar esta ordem era conhecida muito antes de Jesus. Há muito tempo antes se dizia: “Você não deve fazer a seu próximo o que você não quer que ele faça a você”. Mas foi um avanço significativo para Jesus colocá-lo no positivo, dizer que devemos fazer aos outros o que queremos que eles nos façam.
i. “A Regra de Ouro não foi inventada por Jesus; ela se encontra em muitas formas em cenários muito diversos. Por volta de 20 d.C., o rabino Hillel, desafiado por um gentio a resumir a lei no curto espaço de tempo que o gentio podia ficar de pé em uma perna, respondeu: ‘O que é odioso para você, não faça a ninguém mais. Esta é toda a lei; todo o resto é comentário. Vá e aprenda-a’. (b. Shabbath 31a). Aparentemente, apenas Jesus formulou a regra de forma positiva”. (Carson)
ii. Ao fazer isso, Jesus tornou o comando muito mais amplo. É a diferença entre não infringir as leis de trânsito e fazer algo positivo como ajudar um motorista encalhado. Sob a forma negativa da regra, os bodes de Mateus 25:31-46 podiam ser considerados “inocentes”. No entanto, sob a forma positiva da Regra de Ouro – a forma de Jesus – eles são de fato considerados culpados.
b. Façam também vocês a eles: Isto se aplica especialmente à comunhão cristã. Se quisermos experimentar o amor e fazer com que as pessoas se aproximem de nós, devemos amar e nos aproximar dos outros.
i. “Oh, que todos os homens agissem assim, e não haveria escravidão, nem guerra, nem palavrões, nem golpes, nem mentiras, nem roubos; mas sim, tudo seria justiça e amor! Que reino é este que tem tal lei!” (Spurgeon)
ii. Isto torna a lei mais fácil de entender, mas não a torna mais fácil de obedecer. Ninguém jamais fez com os outros de forma consistente o que eles gostariam que os outros fizessem consigo mesmos.
4. (32-35) Amar segundo o padrão do amor de Deus.
“Que mérito vocês terão, se amarem aos que os amam? Até os ‘pecadores’ amam aos que os amam. E que mérito terão, se fizerem o bem àqueles que são bons para com vocês? Até os ‘pecadores’ agem assim. E que mérito terão, se emprestarem a pessoas de quem esperam devolução? Até os ‘pecadores’ emprestam a ‘pecadores’, esperando receber devolução integral. Amem, porém, os seus inimigos, façam-lhes o bem e emprestem a eles, sem esperar receber nada de volta. Então, a recompensa que terão será grande e vocês serão filhos do Altíssimo, porque ele é bondoso para com os ingratos e maus.
a. Que mérito vocês terão, se amarem aos que os amam? Devemos considerar que não se trata de virtude, nem de imitação de Jesus, se simplesmente retribuímos o amor que nos é dado.
i. Lembre-se, Jesus aqui ensinou sobre o caráter dos cidadãos de Seu reino. Devemos esperar que esse caráter seja diferente do caráter que se vê no mundo. Há muitas boas razões pelas quais se deve esperar mais dos cristãos do que de outros:
·Eles afirmam ter algo que os outros não têm; eles afirmam ser renovados, arrependidos e redimidos por Jesus Cristo.
·De fato, eles têm algo que os outros não têm; eles são de fato renovados, arrependidos e redimidos por Jesus Cristo.
·Eles têm um poder que outros não têm; eles podem fazer todas as coisas através de Cristo que os fortalece.
·Eles têm o Espírito de Deus que habita neles.
·Eles têm um futuro melhor do que os outros.
b. Vocês serão filhos do Altíssimo: Ao fazer isso, imitamos a Deus, que mostra amor para com Seus inimigos, e é bondoso para com os ingratos e maus.
i. “O que Deus nos diz quando Ele age assim? Eu acredito que Ele diz isto: ‘Este é o dia da graça gratuita; esta é a hora da misericórdia’. A hora do julgamento ainda não chegou, quando Ele separará entre o bom e o mau; quando Ele montará o tribunal e concederá diferentes porções ao justo e ao ímpio”. (Spurgeon)
ii. Este é um exemplo – que também devemos amar nossos inimigos e abençoá-los se pudermos. Ao fazer isso, nós nos mostramos como filhos do Altíssimo. “Somos feitos filhos pela regeneração, através da fé no Filho; mas somos chamados a consolidar nosso chamado e eleição, para aprovar e reivindicar nosso direito a esse nome sagrado”. Só podemos fazer isto mostrando com palavras e atos que a vida e os princípios divinos nos animam”. (Meyer)
5. (36-38) Os princípios a seguir.
Sejam misericordiosos, assim como o Pai de vocês é misericordioso. “Não julguem, e vocês não serão julgados. Não condenem, e não serão condenados. Perdoem, e serão perdoados. Dêem, e lhes será dado: uma boa medida, calcada, sacudida e transbordante será dada a vocês. Pois a medida que usarem também será usada para medir vocês”.
a. Sejam misericordiosos, assim como o Pai de vocês é misericordioso: No Reino de Jesus, temos um padrão para a forma como devemos dar misericórdia aos outros. Devemos ser misericordiosos para com os outros como Deus tem sido misericordioso para conosco. Isso é muita misericórdia, e só exigiria mais misericórdia de nós, não menos.
b. Não julguem, e vocês não serão julgados: Com esta ordem, Jesus advertiu contra julgar os outros, porque quando o fizermos seremos julgados de maneira semelhante.
i. Entre aqueles que parecem não saber nada da Bíblia, este é o versículo que parece ser o mais popular. No entanto, a maioria das pessoas que citam este versículo não entende o que Jesus disse. Eles parecem pensar (ou esperar) que Jesus ordenou uma aceitação universal de qualquer estilo de vida ou ensinamento.
ii. Um pouco mais tarde, neste mesmo sermão (Lucas 6:43-45), Jesus ordenou que nos conhecêssemos a nós mesmos e aos outros pelo fruto de suas vidas, e algum tipo de avaliação é necessária para isso. O cristão é chamado a demonstrar amor incondicional, mas o cristão não é chamado à aprovação incondicional. Podemos realmente amar as pessoas que fazem coisas que não devem ser aprovadas.
iii. Portanto, embora isto não proíba examinar a vida dos outros, certamente proíbe fazer no espírito, que é feito com frequência. Um exemplo de julgamento injusto foi a condenação dos discípulos da mulher que veio para ungir os pés de Jesus com óleo (Mateus 26:6-13). Eles pensaram que ela havia desperdiçado algo; Jesus disse que ela tinha feito um bom trabalho que seria lembrado para sempre. Fizeram um julgamento precipitado, severo e injusto.
·Quebramos esta ordem quando pensamos o pior dos outros.
·Quebramos esta ordem quando só falamos aos outros de suas falhas.
·Quebramos esta ordem quando julgamos uma vida inteira apenas por seus piores momentos.
·Quebramos esta ordem quando julgamos os motivos ocultos dos outros.
·Quebramos esta ordem quando julgamos os outros sem nos considerarmos em suas mesmas circunstâncias.
·Quebramos esta ordem quando julgamos os outros sem nos lembrarmos de que nós mesmos seremos julgados.
c. Não condenem… Perdoem: Jesus expandiu a ideia além de simplesmente julgar os outros. Ele também nos disse para não condenar e para perdoar livremente.
d. Dêem, e lhes será dado: uma boa medida, calcada, sacudida e transbordante: Jesus encorajou a liberdade de dar sem temer que nos tornemos o perdedor em nossa doação. Ele queria nos libertar do medo de dar demais.
i. Isto é verdade e tem sido testado quando se trata de generosidade com recursos materiais. Dito de maneira simples, não se pode dar mais do que Deus. Ele retornará mais a você, de uma forma ou de outra, mais do que você dá a Ele. No entanto, a aplicação mais apontada disto no contexto não é tanto a doação de recursos materiais, mas com a doação de amor, bênção e perdão. Nós nunca somos os perdedores quando damos essas coisas segundo o padrão da generosidade de Deus.
ii. Será dada a vocês: “O judeu usava uma longa túnica solta até os pés, e em volta da cintura uma cinta. O manto podia ser puxado para cima de modo que a parte do peito do manto acima da cintura formava uma espécie de bolso grande no qual as coisas podiam ser transportadas. Assim, o equivalente moderno da frase seria: ‘As pessoas encherão seu bolso’”. (Barclay)
e. Pois a medida que usarem também será usada para medir vocês: Este é o princípio sobre o qual Jesus construiu a ordem: “Não julguem, e vocês não serão julgados”. Deus nos medirá de acordo com a mesma medida que usamos com os outros. Esta é uma poderosa motivação para sermos generosos com amor, perdão e bondade para com os outros. Se quisermos mais dessas coisas de Deus, devemos dar mais delas aos outros.
i. Poderíamos dizer que Jesus não proibiu o julgamento dos outros. Ele só exige que nosso julgamento seja completamente justo, e que nós só julguemos os outros por um padrão pelo qual também gostaríamos de ser julgados.
ii. Quando nosso julgamento em relação aos outros é errado, muitas vezes não é porque julgamos de acordo com um padrão, mas porque somos hipócritas na aplicação desse padrão – ignoramos o padrão em nossa própria vida. É comum julgarmos os outros de acordo com um padrão e nós mesmos de acordo com um outro padrão, sendo muito mais generosos com nós mesmos do que com os outros.
iii. De acordo com os ensinamentos de alguns rabinos no tempo de Jesus, Deus tinha duas medidas que Ele usava para julgar as pessoas. Uma era uma medida de justiça e a outra era uma medida de misericórdia. Qualquer que seja a medida que você quer que Deus use com você, você deve usar essa mesma medida com os outros.
iv. Só devemos julgar o comportamento do outro quando estamos cientes de que nós mesmos seremos julgados, e devemos considerar como queremos ser julgados.
E. A distinção entre duas maneiras.
1. (39-42) Ilustrações centradas em torno da ideia de ver.
Jesus fez também a seguinte comparação: “Pode um cego guiar outro cego? Não cairão os dois no buraco? O discípulo não está acima do seu mestre, mas todo aquele que for bem preparado será como o seu mestre. “Por que você repara no cisco que está no olho do seu irmão e não se dá conta da viga que está em seu próprio olho? Como você pode dizer ao seu irmão: ‘Irmão, deixe-me tirar o cisco do seu olho’, se você mesmo não consegue ver a viga que está em seu próprio olho? Hipócrita, tire primeiro a viga do seu olho, e então você verá claramente para tirar o cisco do olho do seu irmão.
a. Pode um cego guiar outro cego? Isto é óbvio. O cego não pode guiar outro cego. Portanto, nunca devemos olhar para outros cegos para nos guiar; nem devemos tentar guiar outros em nossa cegueira. Ao invés disso, devemos fazer de Jesus nosso líder, nosso professor, que vê e sabe todas as coisas.
i. Jesus nos lembrou que alguns supostos líderes são cegos – cuidado com eles. Mais tarde, Jesus disse de alguns dos líderes religiosos de Seus dias, Eles são guias cegos. Se um cego conduzir outro cego, ambos cairão num buraco. (Mateus 15:14).
ii. “Embora os fariseus e professores da lei tivessem pergaminhos e os interpretassem nas sinagogas, não significa que realmente os entendessem… Os fariseus não seguiram Jesus; por isso não entenderam e seguiram as Escrituras”. (Carson)
iii. Nestas palavras de Jesus, vemos a culpa daqueles que são líderes cegos dos cegos. Vemos também a responsabilidade dos seguidores de garantir que seus líderes não sejam cegos.
b. O discípulo não está acima do seu mestre: Um discípulo era muito parecido com um estudante, com o elemento adicional de seguir e copiar o professor ou mestre. Desta forma, o discípulo nunca seria maior do que o mestre, mas todo aquele que for bem preparado será como o seu mestre. Nós nos tornaremos como aqueles que seguimos, portanto devemos decidir escolher bons mestres para seguir.
i. Nesta verdade perfeitamente clara e lógica, Jesus fez uma promessa maravilhosa. À medida que formos ensinados por Ele e crescermos nEle, nos tornaremos mais como Jesus. Cada vez mais, somos conformados à imagem de Seu Filho (Romanos 8:29) e, no final, quando ele se manifestar, seremos semelhantes a ele, pois o veremos como ele é (1 João 3:2).
ii. “O Senhor Jesus tornou-se semelhante a nós em nosso estado decaído, para que nos tornemos semelhantes a Ele em sua glória… Deve haver sempre a limitação da criatura quando comparado a Ele, por quem todas as coisas foram feitas. Mas em nossa medida haverá a mesma beleza perfeita – a sua beleza sobre nós”. (Meyer)
c. Por que você repara no cisco que está no olho do seu irmão e não se dá conta da viga que está em seu próprio olho? As figuras de um cisco e de uma viga são figuras reais, utilizadas com humor. Jesus mostra que geralmente somos muito mais tolerantes com nosso próprio pecado do que com o pecado dos outros.
i. Embora possa haver um cisco literal no olho de alguém, obviamente nunca haveria uma viga ou uma tábua literal no olho de uma pessoa. Jesus usou estas imagens exageradas e bem-humoradas para tornar Sua mensagem mais fácil de entender e mais memorável.
ii. É uma imagem bem-humorada: Um homem com uma tábua em seu olho tentando ajudar um amigo a remover um cisco do seu olho. É impossível pensar na imagem sem sorrir e se divertir com ela.
iii. Um exemplo de procurar um cisco no olho de outro ignorando a viga no próprio olho, é quando os líderes religiosos trouxeram a mulher pega em adultério para Jesus. Ela certamente tinha pecado; mas o pecado deles era muito pior e Jesus o expôs como tal com a declaração: Se algum de vocês estiver sem pecado, seja o primeiro a atirar pedra nela (João 8:7).
d. E não se dá conta da viga que está em seu próprio olho: Jesus indica que aquele que tem a viga em seu próprio olho não se daria conta imediatamente dela. Ele está cego pela sua culpa óbvia. É a tentativa de corrigir a culpa de outra pessoa quando nós mesmos temos a mesma (ou maior culpa) que merece a acusação, “Hipócrita!”
i. “Jesus é gentil, mas ele chama aquele homem de ‘hipócrita’ que se preocupa com coisas pequenas nos outros, e não presta atenção aos assuntos sérios em casa em sua própria pessoa”. (Spurgeon)
ii. Nossa hipocrisia nestes assuntos é quase sempre mais evidente para os outros do que para nós mesmos. Podemos encontrar uma maneira de ignorar a viga em nosso próprio olho, mas outros a percebem imediatamente. Um bom exemplo deste tipo de hipocrisia foi a reação de Davi à história de Nathan sobre um homem que havia roubado e matado injustamente a cordeira de outro homem. Davi rapidamente condenou o homem, mas estava cego a seu próprio pecado, que era muito maior (2 Samuel 12).
e. Tire primeiro a viga do seu olho, e então você verá claramente para tirar o cisco do olho do seu irmão: Jesus não disse que era errado para nós ajudarmos nosso irmão com o cisco no olho. É uma coisa boa ajudar seu irmão com o cisco dele, mas não antes de lidar com a viga em seu próprio olho.
2. (43-45) Só podemos seguir Jesus desta maneira se tivermos sido radicalmente mudados por Ele. Se Jesus nos tocou, isso vai se manifestar em nossas vidas.
“Nenhuma árvore boa dá fruto ruim, nenhuma árvore ruim dá fruto bom. Toda árvore é reconhecida por seus frutos. Ninguém colhe figos de espinheiros, nem uvas de ervas daninhas. O homem bom tira coisas boas do bom tesouro que está em seu coração, e o homem mau tira coisas más do mal que está em seu coração, porque a sua boca fala do que está cheio o coração.
a. Nenhuma árvore boa dá fruto ruim… Toda árvore é reconhecida por seus frutos: Este fruto é o resultado inevitável de quem somos. Eventualmente – embora possa levar um tempo para a colheita chegar – o fruto bom ou ruim é evidente, revelando que tipo de árvore nós somos. Nem toda árvore é igual.
i. “Não ter bons frutos é ter o mal: não pode haver esterilidade inocente na árvore invisível do coração. Aquele que não produz frutos, e aquele que produz frutos ruins, ambos servem apenas para o fogo”. (Clarke)
ii. “Não é apenas o ímpio, o portador de bagas venenosas, que será cortado; mas o neutro, o homem que não dá frutos de virtude positiva também deve ser lançado no fogo”. (Spurgeon)
iii. Pouco antes disso, Jesus nos advertiu para nos julgarmos primeiro, para buscarmos o cisco em nosso próprio olho antes de voltarmos nossa atenção para a viga no olho do nosso próximo. Portanto, antes de perguntar isso a qualquer outra pessoa, devemos primeiro perguntar: “Eu dou frutos para a glória de Deus?”
b. O homem bom tira coisas boas do bom tesouro que está em seu coração… porque a sua boca fala do que está cheio o coração: Nossas palavras revelam nosso coração. Se há um bom tesouro no coração, ele será visto; se há um mal, ele também será visto com o tempo. Nossas palavras dizem mais sobre nós do que pensamos, e revelam que alguns são homens bons e outros homens maus.
3. (46-49) Exortação final: fazer o que Jesus mandou é nosso fundamento.
“Por que vocês me chamam ‘Senhor, Senhor’ e não fazem o que eu digo? Eu lhes mostrarei com quem se compara aquele que vem a mim, ouve as minhas palavras e as pratica. É como um homem que, ao construir uma casa, cavou fundo e colocou os alicerces na rocha. Quando veio a inundação, a torrente deu contra aquela casa, mas não a conseguiu abalar, porque estava bem construída. Mas aquele que ouve as minhas palavras e não as pratica, é como um homem que construiu uma casa sobre o chão, sem alicerces. No momento em que a torrente deu contra aquela casa, ela caiu, e a sua destruição foi completa”.
a. Por que vocês me chamam ‘Senhor, Senhor’ e não fazem o que eu digo?Jesus fez uma distinção entre aqueles que meramente fazem uma profissão verbal de fé, e aqueles que de fato ouve mas suas palavras e as praticam.
i. Devemos usar a linguagem “Senhor, Senhor” – não podemos ser resgatados se não o fizermos. Embora os hipócritas possam dizer isso, não devemos ter vergonha de dizê-lo. No entanto, só isso não é suficiente.
ii. Este aviso de Jesus se aplica às pessoas que falam ou dizem coisas a Jesus ou sobre Jesus, mas não o querem realmente dizer. Não é que elas acreditem que Jesus é um demônio; elas simplesmente dizem as palavras de forma muito superficial. Sua mente está em outro lugar, mas eles acreditam que há valor nas palavras nuas e cumprem algum tipo de dever religioso sem coração, sem alma, sem espírito – apenas palavras nuas e pensamentos passageiros.
iii. Este aviso de Jesus se aplica às pessoas que dizem “Senhor, Senhor” e, no entanto, sua vida espiritual não tem nada a ver com sua vida diária. Elas vão à igreja, talvez cumpram alguns deveres religiosos diários, mas pecam contra Deus e o homem como qualquer outra pessoa. “Há aqueles que falam como anjos, vivem como demônios; que têm a língua lisa de Jacó, mas as mãos ásperas de Esaú”. (Trapp)
iv. Jesus colocou isto na forma de uma pergunta: Por quê? “Se somos desobedientes, por que continuar a profissão de obediência? Cada alma culpada do mal referido deve enfrentar este ‘Por quê?’ sozinha. Basta dizer que, para fazê-lo, será inevitável descobrir a indignidade da razão”. (Morgan)
b. Aquele que vem a mim: Aqui, em três breves pontos, Jesus descreveu aquele que O segue em sabedoria e verdade – e prosseguiu para ilustrar a sabedoria de tal pessoa.
i. “Observe com cuidado a tripla condição. 1. ‘Todo aquele que vem a Mim’, rende-se. 2. ‘E ouve minhas palavras’, discipulado. 3. ‘E as pratica’, a obediência”. (Morgan)
c. É como um homem que, ao construir uma casa…: Na ilustração final de Jesus sobre os dois construtores, cada casa parecia a mesma do lado de fora. O verdadeiro fundamento da vida é geralmente escondido e só é provado na tempestade.
i. “O sábio e o tolo estavam ambos empenhados precisamente nas mesmas avocações, e em grande parte conseguiram o mesmo projeto; ambos se comprometeram a construir casas, ambos perseveraram na construção, ambos terminaram suas casas. A semelhança entre eles é muito considerável”. (Spurgeon)
d. Quando veio a inundação: Jesus advertiu que os fundamentos de nossas vidas serão abalados em algum momento ou outro, tanto agora (em épocas de dificuldade) como no juízo final diante de Deus. É melhor testarmos os fundamentos de nossa vida agora em vez de mais tarde, em nosso julgamento diante de Deus quando for tarde demais para mudar nosso destino.
i. O tempo e as tempestades da vida provarão a força da própria fundação de uma pessoa, mesmo quando ela está escondida. Podemos nos surpreender quando vemos quem realmente construiu sobre os bons alicerces. “Finalmente, quando Judas traiu Cristo à noite, Nicodemos o professou fielmente durante o dia”. (Trap)
e. Aquele que ouve as minhas palavras e não as pratica: Ouvir apenas a palavra de Deus não é suficiente para fornecer uma base segura. É necessário que sejamos também cumpridores de Sua palavra. Se não somos, cometemos o pecado que certamente nos descobrirá, o pecado de não fazer nada (Números 32:23) – e completa será nossa destruição.
i. No entanto, ninguém pode ler isto sem ver que não praticou, não pratica e nunca as praticará completamente. Mesmo se as praticamos em um sentido geral (no qual deveríamos), a revelação do Reino de Deus no Sermão da Montanha nos levará de volta mais e mais vezes como pecadores necessitados para o nosso Salvador.
(c) 2021 The Enduring Word Bible Commentary by David Guzik – ewm@enduringword.com